AOKIGAHARA

            Enrolado no edredom, Shin olhava o céu cinzento daquela tarde em Naha, pelo vidro sujo do seu apartamento. Indo do sofá para a cama, em permanentemente estado de sonolência, essa era sua vida desde que retornou da Bolívia, onde foi atrás de um peixe instinto a décadas, o peixe espada de água doce... Na volta ao Japão, Suyen já havia ido  embora, deixando ele sozinho com um monte de peixes mortos num aquário.

            No ano passado, aproximadamente 26 mil pessoas cometeram suicídio no Japão, e Shin estava pensando em somar ao montante desse ano, com uma ida à Aokigahara, a floresta do suicídio. Deixaria uma trilha com barbante até seus restos dependurados numa árvore arrevesada. No laptop procurou por inspiração para uma mensagem de suicídio aos pais, seus poucos amigos e Suyen, mas desistiu quando tudo que conseguiu foram frases sem originalidade. Começou a redigir uma mensagem de amor.

            "Daria minha alma para Emma-Daiō, para impedir meu antigo eu de partir atrás do cabeça chata titicaca orestias. Tudo que encontrei foi o vazio de sua ausência na minha vida, e não poderia ser diferente. Sinto falta de seus mimos, minha hato. Gostaria de ter encontrado uma espécie mágica de peixe que me pudesse fazer voltar no tempo e conseguir impedir que meu antigo eu entrasse naquele bimotor. A dor é imensurável, não posso viver sem a minha sereia. A saída é procurar em outros planos pelo alívio do sofrimento que é não estar ao seu lado nesse. Às trevas...".

            A carta ainda se seguiu por várias páginas, e Shin começou a considerar sua ideia muito boa. Achou que talvez, se aquilo fosse adaptado para um romance curto, ele consideraria ler. A aventura de um ictiólogo na Amazônia, que tem a vida dividia entre duas paixões: peixes mágicos e uma sereia com uma vagina mágica. A Gentosha Inc, uma das maiores editoras do Japão,‎ acabou se interessando pela história e a adaptou para um mangá. Lançado em dois volumes, seu a história foi um sucesso, engenhosa e degenerada. 

            Shin nunca voltou a falar com Suyen, mas conseguiu dinheiro com seus mangás para realizar o sonho de ter em casa uma grande coleção de peixes.