FAMÍLIA
O velho chamou a atenção do menino jogando a moeda para o alto. Era atrativo o som que fazia. Ele pegava a moeda de volta e a girava entre os dedos de ambas as mãos, depois a jogava de volta para o alto.
- Me ensina a fazer isso? - perguntou a criança.
O velho jogou a moeda para o menino e ele a deixou cair no chão. A moeda rolou pela calçada e caiu entre as grandes do bueiro. O velho balançou a cabeça para mostrar seu desapontamento.
- Você tem mãos muito pequenas. Mãos que parecem de uma menina - ele disse, sabendo que não era verdade. Aquela era uma criança, e tinha mãos de criança.
Os olhos se enchendo de lágrimas.
- Agora você vai chorar? - perguntou o velho.
As pessoas que passavam pela rua achavam bonitinho o avô e seu neto.
O menino arremangou a manga, se ajoelhou na calçada e enfiou a mão entre as grandes. Tinha todo tipo de porcaria lá dentro, ele pôde sentir, e o velho ria do seu semblante.
Enfim o menino sentiu a moeda.
Ele retirou o braço do bueiro; sua mão amundiçada. Limpou com os dedos a crosta escura que cobria parte da moeda, podendo ver o brilho prateado.
- Parabéns, agora é só praticar - disse o velho.
Se tudo aquilo foi uma tentativa de ensinamento, ele nunca soube. Acabou jogando a moeda suja no olho do avô. A lesão acarretou em uma endoftalmite, infecção ocular grave causada por fungos encontrados em matéria orgânica.
Depois que o avô ficou cego de um olho, nunca mais se falaram.
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